Alcoolismo, ou Síndrome de Dependência do Álcool (SDAS), como atualmente é nomeada, é um dos tipos de dependência química, ou seja relacionada ao uso de substância psicoativa que, no caso o álcool, age no sistema nervoso central e gera alterações de comportamento, humor e cognições.
É uma substância depressora, capaz de lentificar nossa atividade cerebral, diminuir a velocidade de processamento, provocando a redução de limites, e causando efeitos como desinibição, sonolência, desatenção, desconcentração, letargia.
É uma doença hoje considerada em níveis graves em termos de saúde pública, mas que apresenta dificuldades ainda em seu reconhecimento e tratamento por questões culturais presentes na cultura brasileira que validam o uso social e recreativo do álcool. Muitas pessoas ainda não associam o uso abusivo e frequente do álcool a uma doença, a uma dependência química.
O alcoolismo, assim como outras doenças e dependências químicas, é um complexo fenômeno, já que envolve fatores de natureza biológica (componentes genéticos, hereditários), psicológica (temperamento, personalidade, recursos psicoemocionais), e social (interações sociais, relacionamentos, experiências pessoais, profissionais, cultura, etc). Existem alguns fatores que estimulam e/ou levam muitas pessoas ao uso do álcool de forma abusiva e/ou estabelecer a dependência química, são eles:
- Curiosidade
- Influência de amigos e familiares (incentivo sócio-cultural)
- Busca de autoafirmação (baixa autoestima)
- Desejo de fuga dos problemas (evitação)
- Coragem para agir
- Busca de prazer
- Dificuldades para lidar com situações difíceis, dolorosas
- Hábito (dependência)
- Redução de ansiedade, raiva e/ou irritação (hiper-compensação)
- Facilidade de acesso
E no âmbito das interações sociais, família e amigos, é importante reconhecer qual o papel deles , qual a relação que eles têm no sentido de incentivar o uso ou ajudar o paciente no seu tratamento.
AMIZADES
Como falamos mais acima, os amigos podem ser um dos fatores que estimulam o uso do álcool. Isto acontece quando grupos costumam se reunir com frequência e necessariamente sempre envolvendo o uso do álcool, o que para um dependente ou uma pessoa sujeita desenvolver a dependência química do álcool, este fator termina se configurando como gatilho para o uso abusivo que, com o passar do tempo, estimulam o desenvolvimento da dependência.
Isto não quer dizer que as amizades são sempre um fator de risco. Falar isso seria uma distorção de hiper-generalização. Mas o fato é que, é preciso que a pessoa que tenha a dependência ou esteja sujeita a desenvolver, amplie seu leque de relações de modo que ele possa encontrar pessoas que não façam uso do álcool e sirvam de apoiadoras no seu processo. E que aquelas que façam uso eventual, meramente recreativo, também possam ajudá-la a resistir e restringir o uso de álcool contribuindo positivamente no seu processo de recuperação e prevenção de recaídas, mostrando que é possível socializar-se e divertir-se sem necessariamente envolver o consumo de álcool.
FAMÍLIA
A família é um dos componentes mais complexos e multideterminante nos casos de alcoolismo. Seja pela presença do componente hereditário (base biológica), seja pela transmissão do comportamento (modelação e transmissão transgeracional), seja por gerar outros fatores de estímulo/incentivo ao uso abusivo e dependência (validação do uso do álcool no ambiente familiar , aspectos culturais, facilidade de acesso, frequência de uso x hábitos familiares, relações conflituosas, etc).
Muitos pacientes iniciam seu uso de álcool muito cedo e mesmo dentro do ambiente familiar, seja porque o alcoolismo já está presente e instalado naquela família, seja por fatores de incentivo a partir das interações sociais e familiares.
É muito comum também a presença do uso de álcool associado a outros processos de sofrimento ou adoecimento psicoemocionais (depressão, ansiedade, compulsões, etc). Se é um fator preexistente num contexto familiar, o risco é ainda maior para as crianças neste ambiente entenderem como algo normal, corriqueiro, habitual e mesmo benéfico o uso do álcool, facilitando assim o início cada vez mais jovem e a estruturação da dependência química a partir de influências familiares.
Outro componente importante a ser ressaltado é a resistência de muitos usuários a encarar este hábito como doença, como dependência química, e não entender a necessidade de busca de ajuda e tratamento profissional. Isto prejudica tanto a ele como às relações familiares à sua volta, já que seus familiares muitas vezes são expostos a seus sintomas, prejuízos, internações, acidentes de trânsito, situações difíceis, conflitantes, ou mesmo constrangedoras para eles e para o próprio usuário.
Uma informação de grande relevância sobre o impacto do alcoolismo na família está neste trecho extraído de artigo científico (mais abaixo):
“sobre os efeitos do alcoolismo na família, estudos demonstram que viver em um ‘ambiente alcoolista’ afeta negativamente os descendentes de alcoolistas e que, para cada alcoolista, cinco ou seis pessoas da família são afetadas. Problemas familiares como desavenças, falta de credibilidade e desconfianças são sentimentos despertados nas pessoas que já passaram pela experiência de ter um dependente e, quando há um dependente na família, todos adoecem.” (Filizola, Perón, Nascimento, Pavarini & Filho 2006)
Neste trecho, os autores nos elucidam o quanto o alcoolismo têm este potencial de acometer não só o usuário, mas toda a sua família, assim como a dependência relacionada a outras substâncias psicoativas e mesmo outros quadros de enfermidade. Isto trás a tona a importância de olhar o problema do alcoolismo como sistêmico, não só com foco no usuário, mas também incluir, acolher, ouvir, orientar e convidar os familiares a participarem ativamente do tratamento do paciente em questão, contribuindo para sua melhoria e a de todos envolvidos.
Assim como falamos das relações de amizades, a família exerce um papel chave no tratamento e prevenção. Se o paciente tem uma família apoiadora, com relações mais saudáveis e que entende que de fato aquele familiar tem um problema de saúde a ser tratado, a família pode servir de “escudo” frente à situações de risco, ajudando o paciente a mapeá-las assim como evitá-las, contribuindo positivamente para o tratamento.
Porém, quando se tratam de famílias tóxicas, ou seja, com muitas relações conflituosas, turbulentas, adoecidas ou mesmo que contribuam para o sofrimento psicoemocional do paciente, potencializando quadros de ansiedade, depressão, angústia e inseguranças frequentes dos mesmos, esta família pode se tornar mais um fator de risco para o paciente, e incentivando a buscar alívio do seu sofrimento no uso contínuo do álcool como estratégia “relaxante” e/ou “anestésica” frente ao seu sofrimento.
Para saber mais sobre alcoolismo e compreendê-lo na família e seus impactos, acesse: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-81452006000400007
https://www.nescon.medicina.ufmg.br/biblioteca/imagem/4579.pdf
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