Se tem uma afirmação realista é que ninguém sai o mesmo de uma depressão, de perdas e ou dificuldades. Este é um tema que tem permeado muitas sessões de psicoterapia nos últimos 6 meses.
Muitos pacientes chegam trazendo seus diversos sofrimentos: perdas de parentes e amigos queridos fruto do COVID-19 ou outras enfermidades, acidentes, suicídios, dores por conta de adoecimentos na família, violência doméstica, relações abusivas em casa, no trabalho (home-office ou presencial), sobrecarga de demandas, exaustão, dificuldades financeiras, fechamentos de negócios, perdas de clientes, dívidas, fome, privações, etc. Sofrimentos estes que levaram muitas pessoas a quadros depressivos, transtornos de ansiedade, gatilhos para crises, luto, agravamento de transtornos de personalidade, abuso de substâncias, compulsões, entre outros.
Em algum momento, elas perceberam como suas realidades internas e externas se tornaram mais pesadas, exaustivas, adoecedoras, limitantes, paralisantes, dolorosas. Tiveram a coragem de dar um primeiro passo importante: buscar ajuda profissional de psicólogos, médicos, psiquiatras, nutricionistas, educadores físicos, entre outros profissionais de saúde, dentro das especificidades de cada caso, dentro do que elas entendiam necessitar de auxílio, orientação, cuidado, escuta, estratégias e ferramentas para atravessarem suas jornadas.
Estamos sendo testemunhas de muitas destas realidades de sofrimento, direta ou indiretamente, como parente, amigo, profissional que acompanha, orienta, dá suporte e ajuda a estas pessoas. Mas um ponto muito importante a trazer à luz na reflexão de hoje é: como é possível aprender a partir de momentos críticos.
Situações como estas acima citadas levam cada pessoa a acessar suas vulnerabilidades, seus limites, suas necessidades emocionais, físicas, materiais não atendidas ou faltantes neste contexto, a sentir a intensidade de suas dores, que, num primeiro momento, parecem-lhes não ter fim, serem insuportáveis, limitantes, dilacerantes, cada um ao seu modo, expressando através de emoções, pensamentos, comportamentos, linguagem verbal, não verbal, num grande esforço de buscar sobreviver, tolerar, lidar, aceitar, superar, seguir em frente em suas jornadas.
Pode parecer o fim, pode até mesmo parecer contraditório, por estarmos acostumados a viver numa sociedade que estimula a supressão de dores, sintomas e sofrimentos; mas é exatamente neste encontro com as nossas vulnerabilidades que temos a oportunidade de acessar nossas centelhas de aprendizados.
Quando vivenciamos momentos de vulnerabilidade e nos colocamos abertos a acolher nosso sofrimento, reconhecer e nomear nossas dores, perdas, temos condições de acessar no nosso sistema o que necessitamos para sobreviver, superar e seguir em frente. Temos condições de acessar nossa capacidade adaptativa, de perceber que as dores e sofrimentos são passageiros e nos trazem inúmeros ensinamentos dentro do que necessitamos aprender, tanto individual, quanto como casal, família, coletivo.
A depressão, o luto, perdas e dificuldades convida-nos a parar, desacelerar, nos colocando de frente com o não saber como seguir, com a necessidade de respeito ao tempo do corpo, da mente. Trás a oportunidade de reflexão das insatisfações, frustrações, perdas, reavaliação da vida, do que se trilhou até aqui, o que realizamos, perdas e ganhos. Chama-nos a olhar e reconhecer as mudanças de contextos, de necessidades atuais, de buscar e encontrar novos sentidos.
Por mais difícil e demorado que toda esta jornada pareça ser, certamente cada pessoa sairá diferente de como iniciou seus processos. Sairá mais resiliente, com muito mais recursos internos, com novas estratégias de enfrentamento e de regulação emocional, mais conscientes sobre suas necessidades e direitos, das escolhas a serem feitas, das responsabilidades a assumir, dos “sim” e dos “não” que deverá dizer daqui para frente, para si mesma e para outras pessoas à sua volta. Enfim, cada indivíduo sairá com novos sentidos, novas respostas, novas possibilidades para construir um novo começo, um novo capítulo da sua jornada.
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